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quinta-feira, 9 de abril de 2015

Secretary III - Capítulo 14

Os nove meses
(Música tema do capítulo: Small Bump do Ed Sheeran. Deixe tocando durante todas as cenas, e ignore a última estrofe.
Aviso: Esse capítulo, formado apenas por flashbacks, funciona mais ou menos como um bônus, um extra. É a continuação da terceira cena do capítulo 13, onde os principais conversam na cama. Todos os assuntos tratados a seguir envolvem gravidez, então, se não estiver a fim de ler tal conteúdo, aguarde pelo próximo capítulo.)




Flashback

1º mês

Eu estava grávida. O simples teste de farmácia, no início, apenas incitou a dúvida. O exame médico fez brilhar a certeza. Em todo o caso, meu coração já sabia, de uma maneira desconhecida, desde o momento da concepção. 
Um mês tinha se passado desde o dia em que Joseph perdera sua mãe, Elizabeth. Mas ele parecia bem, sempre sorridente e ansioso. Sempre disposto a estar ao meu lado. Como poderia não me divertir com isso? Aquela protuberância tão esperada ainda nem tinha dado indícios em meu corpo, e ele já me tratava como se tivesse um cristal em mãos. Eu já era capaz de imaginar a grávida mimada que seria. 
Depois de escolher com cuidado minha ginecologista, o pré-natal fora iniciado o mais rápido possível. Não queríamos perder tempo com nada, a necessidade por curtir os momentos que chegavam e preparar os que se aproximavam era crescente. A médica receitou vitaminas e tratou de fazer também uma extensa lista de recomendações, fora os inúmeros conselhos e dicas que recebíamos com o passar das consultas. Era um mundo totalmente novo para nós, aquele casal tão diferente, ladeados por situações complexas e feridas em processo de cicatrização. Assustador e fascinante.
Sem mais nem menos, você percebe estar acariciando a barriga, conversando com alguém que ainda não pode lhe compreender. Longe disso. Se sente mais vulnerável, delicada. Mais mulher. Imensamente responsável... E até mesmo irresponsável, como quando perde o controle das próprias emoções e se tranca chorando feito uma garota na pior fase da adolescência. 
Por vezes, minha mãe parecia mais ansiosa do que eu, já que me ligava dezenas de vezes por dia, sempre perguntando se algo novo acontecera em meu corpo. E, para a minha tristeza, o único sintoma de que uma nova vida crescia dentro de mim eram os indesejáveis enjoos. Sempre fui uma pessoa calma, de certo modo, sempre tentava enxergar o lado bom das coisas... Mas não mentiram quando disseram que os hormônios de uma grávida podem abalar as estruturas de um lar. E, principalmente, das pessoas que ali residem. 
Muita coisa nos aguardava. Muita coisa

2º mês

Aborrecida, encarei meu reflexo no espelho. Os cabelos ainda molhados e o rosto sem maquiagem. Com os pés descalços, caminhei com passos apressados até a cama, encarando os diversos vestidos espalhados. Retirei o que vestia, tomando outro em mãos e começando a colocá-lo. Tudo parecia funcionar perfeitamente bem, até que, mais ou menos pela décima vez, o maldito zíper não queria fechar! Respirei fundo, dizendo a mim mesma que encolher a barriga era errado. Não queria causar incômodo algum ao meu bebê. Sim, poderiam dizer que naquele momento ele se parecia apenas com uma sementinha minúscula, mas não importava. Já era um bebê, o meu bebê. 
E eu até poderia sorrir e comemorar pela casa... Se aquela droga de vestido me servisse! 
Desiludida, desistindo de sair naquela noite, sentei-me na cama e larguei o corpo por cima dos vestidos, encarando o teto com uma expressão fechada. Era um turbilhão de emoções. Medo, excitação, incerteza, angústia, felicidade, alívio. E vontades insanas de chorar. Aquele, com toda a certeza, era o maior problema. Eu sempre fui uma pessoa emocional, chorava com filmes e coisas bobas caso estivesse na TPM, e, ainda naquele comecinho de gestação, já sentia que poderia encher baldes e mais baldes com as lágrimas que derramaria até chegar ao 9º mês. 
Inspirei e expirei algumas vezes, percebendo que não estava mais sozinha no quarto. 
Joseph surgiu um pouco incerto, se aproximando e estendendo uma de suas mãos para que eu a segurasse. Com má vontade, fiz o que ele queria e apenas neguei com a cabeça, deixando que me abraçasse. 
- Não quero mais ir. Divirta-se sem mim, não preciso dessa droga de festa. - afirmei, batendo um dos pés como uma birra. - Nenhum vestido entra, e, quando entra, parece que vai explodir a qualquer momento. Joe, eu não sei o que fazer, nenhuma das minhas roupas está me servindo e... Ai! - exclamei, impulsionando o corpo para trás. Seu abraço se tornara forte demais. Meus seios estavam demasiado sensíveis, doíam por qualquer coisa, os mamilos ardiam levemente se pressionados, um pouco inchados e sua aparência começava a se modificar. Normal. Tudo completamente normal. Eu deveria sorrir com toda aquela normalidade. 
- Desculpe, Demi. Mas, vem aqui... - Joseph puxou-me novamente, mas dessa vez me abraçando de lado. Encostei minha cabeça em seu ombro e deixei que ele beijasse minha testa. - Pare de se preocupar com coisas triviais como roupas que não servem, certo? E sorria, por favor, você sabe que irei até o inferno se for para arrancar essa expressão triste do seu rosto. Estou aqui, não estou? Você não vai enfrentar nada disso sozinha, mulher. Estamos grávidos
Não consegui segurar uma risada aliviada. 
Joseph, definitivamente, levava ao pé da letra as instruções da ginecologista: seja gentil com sua esposa. Seja compreensivo, faça todas as suas vontades e não deixe que o diálogo entre vocês morra. Ela precisa de você mais do que nunca. Seja tudo que ela precisar: homem, amigo, marido. Tenha coragem, diga a ela que não há o que temer. Trate-a como uma rainha. É, é sério, homem, se não fizer isso, é melhor se preparar para o pior
Ele realmente conseguiu levar um pouco de minha tensão embora, até poderíamos ter iniciado um beijo apaixonado... Mas algo parecia subir na velocidade da luz pelo meu esôfago. A leve tontura se revelou, assim como as pernas bambas e o enjoo sem qualquer sinal de piedade. Empurrei o corpo de Joe, para tirá-lo do caminho e corri o mais rápido que pude até o banheiro, ajoelhando-me no chão. Angustiantes minutos depois, com a cabeça girando, me afastei do vaso sanitário e tentei levantar. Fiz o melhor que pude para melhorar meu hálito e aliviar aquele gosto ruim na boca, depois voltei para o quarto. 
Joseph me encarava preocupado. A coragem para qualquer coisa despencou, tudo que eu queria era relaxar e acalmar meu estômago, que ainda parecia querer revirar muitas vezes mais. 
- Vá, eu fico aqui. Jamie vai cuidar de mim. - comentei com um sorriso que tentava lhe passar confiança. Sonolenta e ainda um pouco enjoada, deitei na cama de qualquer jeito, aprumando os travesseiros e fechando os olhos. Logo uma mão começou a brincar com meu cabelo molhado e embaraçado. 
- Não, eu não vou a lugar algum. O que você acha de assistirmos aqueles documentários sobre gravidez que a médica recomendou? 
- Você parece bem mais animado do que eu, coisa que me entristece. Porque, é sério, Joe, eu quero estar animada! Esse é um dos momentos mais felizes da minha vida! Por que não consigo sorrir feito boba e deixar todos esses torturantes sintomas de lado? - ele riu do meu desespero e me envolveu em seus braços novamente. Algo me dizia que aquele homem tornaria tudo mais fácil. E esse palpite precisava apenas de mais alguns meses para se concretizar na mais linda certeza. 
Sorri, finalmente conseguindo sentir a alegria que tanto almejava. 

3º mês

Finalmente. Finalmente a saliência em minha barriga poderia ser perfeitamente notada. E eu queria exibi-la para todos, queria gritar para os quatro cantos do mundo que faltavam apenas seis meses para que eu fosse mãe. Apesar de me sentir muito sensível, também sabia que seria forte o suficiente. Graças às aulas de Yoga, por exemplo, consegui me livrar do baixo astral e do pessimismo, encontrando somente os caminhos bons daquele percurso. Conferi minhas roupas no espelho, calcei sandálias pretas com um pequeno salto e fiz uma trança nos cabelos. Gritei porJoe, pedindo para irmos logo. Aquele, sem dúvidas, era um dos dias mais esperados: o primeiro ultrassom

Já confortável em uma espécie de maca apropriada para aquele procedimento, me livrei da blusa de listras e fiquei apenas com a de baixo, de tecido mais fino, a erguendo até ter a barriga totalmente à mostra. Uma substância gelatinosa, gelada e de cor azulada fora colocada na região. Parecia inútil tentar controlar as batidas aceleradas de meu coração, assim como minhas mãos que suavam de ansiedade. A especialista sorriu serenamente para mim e Joseph, que andava de um lado para o outro antes que o processo realmente fosse iniciado. Em seguida, o aparelho encostou-se em minha pele, sendo movimentado em várias direções. Ao receber uma ordem para relaxar, com meu marido ao lado, disposto a me acalmar enquanto segurava minha mão ou simplesmente conversava comigo, fechei os olhos e soltei o ar. Sabia que, assim que os abrisse novamente, a mágica começaria. 
Com os olhos grudados na tela, aos poucos comecei a enxergar uma pequenina forma balançar juntamente com o resto da imagem, em preto e branco. Olhei maravilhada para Joseph, que fazia questão de corresponder meu olhar. Seus olhos verdes cintilantes, apesar das olheiras por não conseguir dormir bem à noite - andava ansioso demais! -, não perdiam a beleza. Beijamo-nos umas três vezes, segurando as lágrimas, e então voltamos a olhar para a tela. 
A médica ergueu as sobrancelhas e abriu um sorriso, movendo novamente o equipamento. Lançou-me um olhar como se quisesse avisar algo. Logo captei do que se tratava. 
Aquele som
Um som baixinho, mas repetitivo. Entrava pelos meus ouvidos, produzia lágrimas em meus olhos, acelerava meu coração e despertava a sensação de alívio por todas as partes do meu corpo. O sangue corria mais livre e puro pelas minhas veias. Talvez, apenas ali, dentro daquele consultório, consegui realizar totalmente o se passava em minha vida. Era mais real do que nunca. Seu coraçãozinho batia, batia e batia. O melhor som que já tive o privilégio de escutar. Ainda não sabíamos se era um menino ou uma menina, mas já o amávamos muito mais do que o suficiente. Daríamos nossas vidas por ele. 
- Incrível, não é? Esse é o coração do bebê de vocês, que está se desenvolvendo perfeitamente bem pelo que vejo. - analisou meticulosamente a tela, anotando algo em um relatório. - E,Demetria, suas próximas vindas aqui serão ainda mais emocionantes, eu asseguro. - concordei com a cabeça, lembrando do fato de que poderia assistir o que aquela telinha transmitia quantas vezes quisesse. Joseph solicitou a gravação daquele ultrassom, então eu poderia assistir com Jamie, meus amigos, minha família... Quantas vezes quisesse. Era incrível! 
Alguns minutos de explicações da médica prendaram completamente minha atenção. Ela detalhava tudo que seu extenso conhecimento lhe permitia dizer. Detalhe por detalhe, até mesmo coisas que ainda não aconteciam. Um pouco em choque, como se por algum motivo idiota esperasse acordar de um lindo sonho, olhei para o lado e tive vontade de rir com a cena que enxerguei: Joseph chorava. Chorava desimpedido, sem se importar com o fato de que não estávamos sozinhos. Totalmente emocionado, como um garotinho. 
- Obrigado, Demetria. Muito obrigado por tudo isso... Eu te amo. - aproximou-se, voltando a me beijar. - Obrigado por me dar esse presente, eu... Eu te amo! Droga, homem, pare de chorar! - repreendeu a si mesmo, limpando as lágrimas e arrancando mais risinhos meus e da médica. Desejei que minha mãe estivesse ali também, e o resto das pessoas que gostaria de dividir aquela etapa de minha vida. Limpei outra de suas lágrimas, acabando por me contagiar com seu estado. 
- Ei, acalme-se! - demos um selinho. - Você não tem que me agradecer. Merece tudo isso e muito mais. E, de agora em diante, nossa vida será assim. Será incrível, eu prometo! 
- O coração dele, o coração do nosso filho! - exclamou novamente, como se ainda não tivesse processado a informação. - Você pode me beliscar, Demi? Ainda não sei se consigo acreditar totalmente em tudo isso. Parece um sonho... 
- Confie em mim: não é um sonho. Agora acredito sem medo. Cegamente e completamente. E eu amo você. - afirmei com toda a convicção do mundo, olhando para a tela por uma última vez. Ali, mesmo tão pequena e indefinida, estava a prova de que toda a tempestade não fora em vão. Ali estava a prova de que eu lutaria novamente, quantas vezes fosse necessário, para chegar até aquele momento. A expressão de felicidade e orgulho no rosto de Joseph não tinha preço. 
Era o suficiente para garantir uma quantidade de felicidade que me manteria forte e confiante pelo resto da vida. 

Naquele mesmo dia, saímos para comemorar. Escolhi vestes leves devido ao clima ameno e deixei meus cabelos soltos. Pelo menos eles continuavam brilhantes e impecáveis, não sofrendo alteração alguma devido a gestação. Depois de passarmos por um bom restaurante, Joseph simplesmente segurou minha mão, me guiando até o carro, então embarcamos por alguma direção desconhecida. Ele não quis me dizer para onde iriamos, e eu sabia que ficar teimando para descobrir não o faria mudar de ideia. Comecei a entrar em pânico quando percebi que já estávamos mais de uma hora longe de casa, o questionando sobre isso. 
Quando o carro parou, exatamente de frente para um enorme portão de madeira, tudo que eu conseguia enxergar eram grandes roseiras que ladeavam um caminho coberto por grama que levava até uma extensa casa com aparência de interior. Parecia um tipo de fazenda, só que um pouco mais simples. 
- Você é louco, Joseph? Programa essa viagem e nem me avisa? Deixamos Jamie em casa, não trouxemos mais roupas e... - ele não dava ouvidos ao que eu falava, só puxou minha mão e nos colocou para dentro daquele portão. Desistindo de debater, olhei mais uma vez para as roseiras e me aproximei encantada. Toquei meus dedos em uma delas, fitando o que elas escondiam e encontrei uma paisagem incrível, juntamente com o por do sol. Parado atrás de mim, Joe segurou meus ombros e começou a massageá-los bem de leve, impulsionando meu corpo para baixo até conseguir fazer com que eu me sentasse junto a ele. Então ficamos ali, no meio das roseiras simplesmente pensando em tudo que acontecia com nossas vidas. 
- Como o mundo dá voltas, não é, Demi? E pensar na maneira como nos envolvemos... - ele tinha o olhar perdido na paisagem rural a nossa frente, segurando minha mão e brincando com seus dedos por ela, distraído. 
- O que você não sabe, é que naquela época eu prometi a mim mesma que ainda me casaria com você, teria filhos com você e tudo o mais. 
- Então você era bem insana por fazer planos assim baseados em um homem como aquele.
- Bem... Eu fiz esses planos e estou casada com ele, esperando um filho dele. Isso é demais para você? 
Com um sorriso, me puxou e deitou nossos corpos. E daquela forma permanecemos sem calcular espaço ou tempo, só aproveitando a calmaria do momento. 

Acordei de repente, com um pouco de suor na testa. Ignorando o sonho estranho, senti meu estômago roncar. Permaneci quieta por instantes, apenas ajeitando as alcinhas da camisola e tentando me livrar daquele estranho pensamento. Lá estava um deles: os desejos loucos da gravidez. Uma vontade absurda tomou meu corpo. Eu tentava deixar para lá, até mesmo fechei os olhos e disse ao meu cérebro para parar de pensar em atrocidades gastronômicas e me deixar dormir em paz, mas parecia algo tentador demais. E talvez até nojento demais. O que fazer? 
Demetria, o que foi? - Joseph adiantou-se a perguntar com a voz sonolenta, me surpreendendo. Tinha sempre o sono pesado, então como conseguiu acordar tão rápido? 
- Não foi nada. - neguei, erguendo meu corpo e pressionando as costas na cabeceira da cama. Não podia incomodar Joe com uma loucura como aquela. Então, eu apenas fechei os olhos com força e mandei várias vezes que o desejo fosse embora. Lutando contra o próprio corpo que exigia arrego, Joe imitou minha posição na cama. 
- Vamos, me diga. O que está acontecendo? Não se sente bem? Vou ligar para... 
Shhhh! - deixei o som sair exagerado pelos meus lábios, massageando as têmporas. - Pare de falar, talvez assim vá embora. 
- O quê? 
- Esse desejo! 
- Pelo amor de Deus, mulher, do que você está falando? 
Uma irritação me possuiu. O segurei pela gola da camiseta e olhei fundo em seus olhos, soltando o ar com força e reconhecendo que deveria soltá-lo. Seus olhos arregalados me fitavam com pavor. Era errado torturá-lo daquele jeito, Joe realmente se esforçava e tinha, muita, muita paciência comigo. Eu sabia que por dentro ele já deveria estar prestes a explodir. 
- Eu quero sorvete de pistache com cogumelos por cima, mas tenho de comê-los assistindo Titanic, e com um vestido vermelho. - expliquei em voz alta, animada com a ideia, mesmo que fosse grotesca. - Sorvete de pistache, me entendeu? Estou até sentindo o gosto na boca! - gesticulei exageradamente, notando uma produção excessiva de saliva em minha boca, exatamente semelhante a quando se está com muita fome. Conseguia assustá-lo cada vez mais. Suas sobrancelhas se uniram. 
- Mas o que diabos Titanic e vestido vermelho tem a ver com isso? 
- Eu é que vou saber? Sonhei com isso, e agora tenho essa necessidade esquisita. Mas, deixe para lá, onde é que vamos encontrar sorvete de pistache e cogumelos a essa hora da noite, não é mesmo? - voltei a me deitar, virando de lado e deixando apenas minha cabeça de fora das cobertas. Sorvete de pistache. Cogumelos. Sorvete de pistache. Cogumelos. 
Mas que sensação horrível! 
Logo me vi sozinha por entre as cobertas quentinhas. 
- Me espere, não durma, vou trazer o que você quer. - Joe sorria confiante, como um super-herói se preparando para salvar toda uma humanidade do mais completo caos. 
Deus, eu não merecia aquele homem! 
- Obrigada, não sei o que faria sem... - tapei minha boca com uma das mãos que suavam frio. - De novo, não! - saltei para fora da cama, tropeçando em meus próprios pés até alcançar o banheiro. Realmente, era uma bela rotina. E a vontade de comer aquelas porcarias misturadas só pareceu aumentar depois que o enjoo se esvaiu. 

4º mês

Tentei dissipar aquela vontade de gritar, de sair chutando tudo e depois chorar de arrependimento. Chorar, chorar e chorar. Expelir lágrimas até que não houvesse mais nenhuma disponível. Os enjoos não existiam mais, o problema era com o meu corpo que parecia cada dia mais pesado. No mesmo instante em que eu sorria, já sentia o sangue ferver sem motivo aparente. Eu tentava ao máximo procurar maneiras de me acalmar. Exagerava nos doces, nos documentários e filmes sobre gravidez. E principalmente na Yoga. Eu me lembrava de ter ficado praticamente um dia inteiro só praticando aqueles exercícios, fazendo uma pausa ou outra para conversar com Jamie - ele me acalmava muito também - ou ler algum livro. 
Certo dia, enquanto eu acreditava ter apenas nossa empregada em casa, passei algum tempo escolhendo alguns CDs, depois coloquei para tocar um que me agradava bastante e tentei deixar a música me levar. Empolgada, logo me vi em cima da cama, cantando e encenando como se estivesse de fato fazendo um show para uma vasta platéia. 
A porta fora aberta. Tempos antes, aquilo não me aborreceria, mas naquele momento senti meu rosto corar e larguei meu corpo na cama, ficando sentada. Joseph tinha me flagrado cantando loucamente uma música do Bon Jovi. E começou a rir espontaneamente. Eu segurava a colcha com força, tentando fingir que a vontade de arrancar sua cabeça não começava a me invadir. 
O desgraçado não parava de me olhar. 
Minha cabeça doía, assim como os seios e as pernas. Então eu explodi. Foi inevitável. 
- O QUE É QUE VOCÊ ESTÁ OLHANDO, JOSEPH? - gritei, saindo da cama e indo para mais perto dele. - ACHA MESMO TUDO ISSO ENGRAÇADO? Bom saber, muito, muito bom saber. - passei como um furacão por ele, esbarrando nossos corpos. Fui desesperada até o banheiro, revirando tudo até encontrar algum remédio para aquela cabeça que não parava de latejar. Quando retornei ao quarto, ele estava sentado na cama, cabisbaixo. Xingando-me incontáveis vezes, rompi a distância entre nossos corpos e o beijei. Sim, larguei meu corpo sobre o seu com cuidado e uni nossos lábios de forma ardente. Com medo de me machucar, rapidamente Joseph interrompeu o que fazíamos e me olhou nos olhos. Seu olhar me enterneceu, então cedi arrependida, acariciando sua bochecha. 
- Você acha mesmo certo me assustar desse jeito, Demi? - indagou com uma voz baixa, quase como um sussurro. Sabia que meu rosto estava pálido. 
- Te assustar? - ri um pouco descrente, tomando uma considerável distância dele e cruzando os braços. - Sim, vamos apenas fingir que quem deve ficar assustado aqui é você. Vamos apenas fingir que quem sangrou semana passada foi você. - Joseph se levantou com violência da cama, ficando de frente para mim. 
- Então não tenho a opção de me preocupar? Minha esposa, grávida de um filho meu, tem um sangramento e eu tenho que ficar calmo? - alterado, ele começava a andar de um lado para o outro do quarto. - Se você parasse de se preocupar com besteiras, talvez aquilo não tivesse acontecido. 
- Agora a culpa é minha? Poupe-me, Joseph! - engoli as lágrimas. - Você podia parar de exigir tanto de mim e começar a fazer mais. Podia pelo menos tentar entender que eu realmente estou com medo, muito mais do que você. Se pensa que esse bebê não é importante para mim, faça um favor: suma da minha frente agora mesmo! 
Silêncio. 
Apenas a preparação para o que viria a seguir. 
- E eu... - fui interrompida. 
- CHEGA! Estou cansado disso! - assustei-me com sua expressão e voz tão alta, encolhendo um pouco o corpo e dando alguns passos para trás. Instintivamente levei uma mão até a barriga. - Não ouse falar como se eu não estivesse fazendo o melhor que posso por aqui. Tenho paciência, aguento seus ataques, sempre faço o que me pede... E ainda acha que tem o direito de dizer que eu não entendo, que não me esforço? Chega, Demetria, chega! Sei que não é fácil, mas chega de descontar em mim. Vou para a empresa, peça ajuda a suas amigas, já que olhar para mim parece te fazer mal. - pegou seu casaco e, lançando apenas mais um último olhar vago, bateu a porta. Algo fora quebrado no andar de baixo, pude identificar. Um vaso, talvez. 
Meus olhos e nariz arderam, então minha testa se enrugou e aquele choro teve início. Sentei-me no chão mesmo, com um pouco de dificuldade e abracei meus joelhos, escondendo meu rosto e deixando aquele desabafo fluir. Não era justo o que eu estava fazendo com ele, não era justo! Eu só queria poder me livrar de todos os medos e incertezas, esquecer de um passado amargo e viver minha vida como deveria viver. 
Alguém abriu a porta, dando passos leves. Logo se sentou ao meu lado. Mãos pequenas tentaram envolver meu corpo, então constatei que se tratava de Jamie. Desfiz aquela posição e passei meus braços pelo seu corpo, o abraçando e deixando que seu rosto se aconchegasse em meu peito. Enquanto seus dedos finos mexiam em meu cabelo, continuei esperando que as lágrimas secassem. Depois, o garoto me olhou nos olhos e sorriu sem mostrar os dentes. Do lado de fora da janela, era notável o clima frio que se alastrava. 
- Vocês ainda vão rir muito disso. - ele disse simplesmente, me soltando. Mordi o lábio e limpei as lágrimas com as costas da mão. Levantei-me, procurando por um casaco. 
- Venha, Jamie, vamos dar uma volta. 

Vários dias depois...
(Para entender melhor a próxima cena, sugiro que dê uma lida nessa cena extra)

Era um campo florido. 
O cheiro suave das flores penetrava minhas narinas enquanto meus passos lentos completavam aos poucos aquele trajeto. 
Observei tudo ao meu redor, com um sorriso tímido no rosto. O sol brilhava sobre minha cabeça, e a leve brisa movimentava a saia do vestido branco que eu usava. Diversos olhares me receberam, sorrisos se iluminaram em minha direção. A frente, parado diante de um altar montado exatamente para aquela ocasião, enxerguei Joseph. Suas roupas pretas e impecáveis de noivo o deixavam deslumbrante. Sim, aquele era o nosso segundo casamento. Enquanto meus dedos trêmulos seguravam as peônias brancas, alguns fios de meu penteado se desprendiam e a distância era reduzida aos poucos. Nossos olhares se encontraram. Uma sensação engraçada tomou conta de meu peito. Nós já tínhamos nos casado mais ou menos, porém, naquele segundo casamento, a sensação de medo não andava ao meu lado juntamente com meu irmão Peter. Tentar enxergar a minha frente e procurar pelo futuro não era um martírio, mas sim um presente. Algo me dizia que daquele casamento em diante, sim, eu teria muitas recordações boas a guardar. E uma delas já estava disponível: Jamie parado do outro lado do altar, sorrindo. Um homenzinho com o pequeno terno preto que vestia. Pelos diversos bancos que ladeavam meu caminho, avistei todos os rostos conhecidos. 
Então fui entregue a Joseph. Novamente
Ele brevemente beijou minha testa e quase sugou minha alma com os olhos verdes tão eletrizantes. Ignorei a leve falta de ar pelo nervosismo e respirei com calma, dizendo com um aceno de cabeça que estava pronta para o que quer que viesse de novo em nossa vida daquele momento em diante. Após acariciar minha barriga, Joseph virou-se e eu imitei seus movimentos. 
A cerimônia seguiu, até que o momento mais especial e crucial chegou. 
Com todos os convidados em silêncio, esperei por aquela pergunta que poderia responder quantas vezes mais meu marido quisesse. Renovar nossos votos era algo que eu toparia fazer uma vez por mês se fosse da vontade dele, exageros a parte. 
Até que algo inesperado roubou minha atenção. 
Paralisada, senti algo de diferente em meu corpo. Todos me encaravam, inclusive Joseph, visivelmente preocupação pela palidez repentina que revestiu meu rosto. Pisquei os olhos algumas vezes, tentando sentir de novo. Consegui. Segurando o buquê com apenas uma mão, levei a outra até minha boca, olhando para cima e evitando as lágrimas. Exatamente quando o 5º mês se aproximasse, assim como a ginecologista havia me explicado. Aconteceu
Demetria... - Joseph me chamou cuidadosamente e algumas pessoas ao redor já tinham tratado de se levantar, prontos para qualquer emergência. Eu queria criar forças para dizer a todos que não tinham com o que se preocupar. Muito pelo contrário. - Demi, o que está... 
- Ele... Ele acabou de chutar... - provavelmente meu marido esperava ouvir um "Eu aceito", mas acho que aquelas palavras obtiveram um efeito melhor. E isso ficou evidente assim que um largo sorriu se abriu em seus lábios, misturado com a confusão presente em seu rosto. Seus dedos logo trataram de segurar minha barriga. Nosso filho havia se manifestado pela primeira vez. E eu desejava com todas as forças que não parasse com os leves chutes, pois poderia sentir aquela emoção e amor crescentes no peito pelo resto dos tempos. - Joe, ele chutou! 
- Meu Deus, eu senti! - arregalando os olhos verdes, ele me largou e ficou de frente para todos os convidados, se preparando para anunciar algo em alto e bom som. - MEU FILHO CHUTOU! Ficou claro ou vocês querem que eu repita? Porra, meu filho... 
- Tenha respeito, por favor, Joseph! - o padre o repreendeu, o obrigando a morder o lábio e escolher os ombros, sustentando uma expressão mais do que inocente. 
Todos começaram a aplaudir, é claro. Eu não sabia se ria, chorava, voltava a acariciar minha barriga ou virava o mundo de cabeça para baixo em busca de forma para gravar aquela nova sensação. 
- Mas que momento oportuno, hein, meu amor? - falei com minha própria barriga. 
Demetria, acho que você está esquecendo de algo, gata! - gargalhei ao ouvir Scarlett gritar do outro lado. 
- Sim, é claro. Eu aceito! - sorri para o padre, arrancando risinhos de todos os presentes. 
E aquele lindo dia teve continuidade, sem surpresas ruins como em meu casamento anterior com o mesmo homem. O único homem de minha vida. Fora mais do que épico. 

5º mês

- É uma menina, com toda a certeza. - eu disse presunçosa. 
- Pare de querer prever o futuro, mulher! Mas é óbvio que é um menino. - ele retrucou, ainda mais presunçoso. 
- Cale a boca ou vou jogar esse pão em você. 
- Posso até calar, mas isso não muda o fato de que é um menino. 
- Quer apostar? 
Olhou-me destemido, terminando de tomar seu vinho em apenas um gole. Uma saudade imensa de um bom vinho se fez presente. Mas o importante era que alguns dos desconfortos e os sangramentos tinham me deixado em paz. Ainda na mesa, encarávamos um ao outro com sobrancelhas erguidas, feito dois oponentes. Já sentia vontade de comer tudo que via pela frente, então pedi uma breve pausa do contato visual exagerado e dei mais algumas garfadas naquela comida que, pelo menos para mim, estava deliciosa. 
Fome, fome, fome. 
- É uma menina. - voltei a afirmar ao terminar de mastigar e tomar um gole de suco. - Já mencionei que sonhei com lacinhos e a cor rosa? 
- Isso não passa de uma maneira maluca do seu subconsciente afirmar que é um menino, acredite. - provocou-me com aquela sua típica expressão de garoto arteiro. - Vai mesmo ir contra a opinião da sua mãe? Todos concordam comigo. É um menino, Demetria, pelo amor de Deus! 
- Certo. Então, se for um menino, farei o que você quiser que eu faça durante uma semana. Mas, se for uma menina... 
- Tudo bem, entendido. Prepare-se para se submeter aos meus desejos secretosDemi! Terá o privilégio de perder. - ciente de que aquele suposto desafio não passava de uma brincadeira, torci os lábios para a comemoração rápida que ele fez e dei uma risadinha irônica, percebendo que na verdade não fazia muita diferença. Sendo menino ou menina, o importante era tê-lo conosco. 
Joe apenas me olhava enquanto eu tentava saciar todo aquele apetite. Acontecia muitas vezes, ele simplesmente se distraía enquanto me fitava, provavelmente fazendo diversos planos. 
- Pare de me olhar, estou horrível! E louca com esse apetite que não cessa. 
- Não, não está. - frisou bem as palavras, disposto a fixá-las em minha mente. - Isso tudo é tão bom, não é? Com certeza devemos repetir a dose. - degustei minha salada, o encarando levemente confusa. 
- Repetir? Você quer dizer ter mais bebês? 
- Exatamente. Escolhi você para ser a mãe dos meus filhos, e não irei me conformar com apenas dois. - fingi não estar prestes a engasgar, arregalando os olhos com aquela ideia. Éramos uma fábrica de grande produção, por acaso? 
- Até que é uma boa ideia, sabe? Pelo menos teremos uma família grande. E uma dor de cabeça grande, preocupações grandes... 
- Mas não sairemos do lado deles. - seu olhar fitou as louças na mesa, parecia distante. 
- Jamais. - concordei. - Ajudaremos todos com suas decisões cruciais, questionamentos da vida... Tudo! 
- Desde que estejamos juntos, daremos um jeito no resto. - ele esticou seu braço, alcançando minha mão. A segurou, deslizando o polegar pelas costas da mesma. 
Joseph seria imensamente diferente de seu pai. 

Sorri maliciosa ao adentrar o quarto, abrindo lentamente meu robe e revelando uma camisola branca bem, digamos, provocante. Pelo menos eu contava com o máximo de sensualidade que uma gravidez permitiria. E um apetite sexual questionável. Brincando com meus próprios cabelos longos e soltos, caminhei até a cama, mas ele mal parecia me tomar, trabalhava em seu notebook. Então, com cuidado, encostei as duas palmas de minha mão sobre o colchão, apoiando também os joelhos e engatinhando até ele, distribuindo beijos insinuantes em seu rosto e pescoço. Uma de suas mãos foi até minhas costas, acariciando o local. 
- Vejo que não está mais com dor. - provocou. Passei uma de minhas pernas pelo seu corpo, tentando não parecer absurda por querer sentar em seu colo com aquela barriga que cada dia crescia mais. Seu olhar pecaminoso entregou que Joseph não se importava e que, na verdade, como havia dito diversas vezes, me achava linda. Mais linda do que nunca. Passadas algumas dores, um calor rodeava todo o meu corpo. O desejo pelo corpo dele fazia com que eu não me segurasse antes de segurar os cabelos de sua nuca com vontade, grudando nossos lábios. Mas para a minha tristeza, Joe quis encerrar aquilo. 
Para ele, era como se um sinal vermelho piscasse. Parecia ter adquirido um desprezível mantra. "Não toque!
Tentada a conseguir o que eu queria de qualquer maneira, fui abrindo vagarosamente os botões de sua camisa, inclinando um pouco meu corpo até ficar deitada na cama, tendo a possibilidade de beijar sua pele. Fechando os olhos e segurando os lábios com os dentes, meu marido tentou me puxar pelos ombros, para me deixar sentada. Neguei com a cabeça. 
Conseguindo quebrar sua tensão e o livrar daquele maldito jeito receoso de me tratar, retirei o robe de uma vez e abaixei uma das alcinhas da camisola. 
- Entenda uma coisa: - comecei, sussurrando perto de seu ouvido. - Ainda sou eu aqui. Ainda é a Demetria, sua esposa, aquela que você ama enlouquecer. E ela quer que você a enlouqueça agora. Então, se não se importar, vamos logo ao que interessa. 
Suas mãos determinadas agarraram meus quadris, me obrigando a sentar novamente em seu colo. Finalmente eu começava a conseguir o que queria. 
- Não quero machucar vocês. Mas como é que posso resistir? - seus lábios quentes tocaram meu pescoço, arrancando um leve gemido dos meus lábios. - Espere só até nosso filho nascer e você se recuperar. Vai pagar caro por todas essas provocações, por me deixar desconcertado desse jeito. 
- Que tal me fazer pagar agora? Não tem problema. - passei a língua pelos lábios, olhando em seus olhos. Movimentei meu corpo junto ao dele, roçando ambos. 
- Pare ou não vou me conter. - ele lutava consigo mesmo. Travava uma batalha interna para retirar sua mão de minha coxa, tentada a escorrer para o quadril. Mas parecia algo humanamente impossível para o seu corpo, que naquele momento desejava o meu. - Deus, como é que posso me abster disso? É cruel, é tão cruel... - sentindo sua boca em meu colo, o estimulei com os gemidos baixinhos que continuavam. - Se bem que eu prefiro você desse jeito, faminta e sexy. Não é bem melhor? 
- Será melhor quando me der o que eu quero, Jonas. 
- Você concorda com isso? - Joseph apontou para a minha barriga, espalmando sua mão ali, falando diretamente com o bebê. Coincidentemente, senti um chute. Rimos juntos. - Se for um menino, o que é uma certeza, ele será um grande jogador de futebol! - ele afirmou, bancando o típico pai orgulhoso antes mesmo da hora. Tratei de desconversar e voltar ao ponto anterior. 
- A médica disse que não tem problema algum, só devemos ter cuidado. - lembrei a ele, brincando com meus dedos por toda a extensão de seu abdômen, até chegar ao cós de sua calça, de onde era possível enxergar as duas entradinhas irresistíveis. - Não vou me privar de um marido tão... - sorri marota, mordendo a própria língua na intenção de esconder a palavra. Ele me lançou um olhar indecifrável, como se tentasse procurar uma desculpa. Então me vi frustrada e triste, de repente. A suposta ideia dele não querer aquilo foi certeira. - A menos que você não me queira... - afastei um pouco meu corpo, aparentando uma fragilidade incomoda. 
- Ei, ei, volte aqui! - sua mão segurou meu pulso, grudando nossos corpos novamente. - É claro que eu quero. 
- Então venha me ter. - pedi, quase implorando. 
Carinhoso, ele fez com que eu me deitasse, sem colocar seu corpo por cima. Distribuiu alguns beijos, enquanto tirava a camisola e minha calcinha aos poucos, sem pressa e com dedicação. Fechei os olhos, aproveitando. Aquele homem sabia como me tratar, jamais me machucaria. Em suas mãos eu me sentia bem, em suas mãos eu estava segura e realizada. Estavam enganados aqueles que disseram que durante a gestação uma mulher não é capaz de sentir muito prazer. Eu estava deitada de lado e ele atrás de mim, também de lado. Uma posição favorável para a minha condição. Joseph conseguiu me levar ao paraíso, mesmo que de forma sutil, mesmo que parasse a todo o momento para perguntar se eu me sentia bem... 
ESTOU BEM, AGORA CONTINUE COM ISSO ANTES QUE EU TE MATE! - um pouco assustado e querendo rir, ele continuou a se movimentar, levando meu estresse embora. - Continue, meu amor... - pedi novamente, em meio a gemidos abafados. Seus dedos tocaram meus lábios, impedindo que outras palavras escapassem. Não posso negar que me senti um pouco insegura durante aquele contato tão íntimo, já que uma voz dentro de minha cabeça ficava questionando a todo o momento: será que ele está sentindo prazer, mesmo desse jeito tão cauteloso? 
- Sei o que estou fazendo, fique quieta. - sua voz soprou perto do meu pescoço, autoritária e ofegante. O corpo viril e coberto por suor fazendo maravilhas pelo meu, que, apesar das diversas mudanças, continuava a querê-lo como sempre. 

6º mês

Assim que a aula de Yoga terminou, me adiantei ao retirar aquelas roupas de ginástica, tomando um breve banho e colocando um vestido confortável, de bom cumprimento e tecido bem leve, para não marcar muito o corpo. Calcei as sapatilhas e fiz um coque frouxo no cabelo, pegando também um casaco preto para fugir do frio. Não podia negar, sentia certa falta dos saltos altos e das roupas mais justas. Mal podia esperar para poder usá-las novamente. A vantagem naquele momento era não ter nada me apertando, marcando e causando dor em minhas panturrilhas. Ajeitei meus pertences na bolsa e me despedi das mulheres que ainda circulavam pelo local, caminhando em direção a saída. Todos pareciam olhar para a minha barriga saliente, e algumas pessoas realmente demonstravam curiosidade, com a vontade de se aproximar e me perguntar coisas sobre o bebê. Grávidas são sempre queridas por onde passam, eu começava a perceber. 
Mentalizando que as pontadas nas costas, a dor enjoativa na cabeça e o sono inapropriado iriam embora assim que eu tratasse de esquecê-los, parei do lado de fora do estúdio e peguei meu celular, ligando para Joseph e dizendo que ele já poderia ir me buscar. Dizendo que logo chegaria, meu marido desligou. Passaríamos rapidamente em casa e então iríamos até a clínica, onde outro ultrassom seria realizado. Eu não queria criar muitas expectativas, mas, de acordo com o que a ginecologista avisou, talvez já fosse possível descobrir o sexo do bebê. 
Sorri sozinha com a possibilidade. 
Quinze minutos se passaram, e eu continuava ali. Nuvens escuras se formavam no céu, e meu coração começava a acelerar sem que eu tivesse direito algum de controlá-lo. Onde diabos Joseph teria se metido? Custava no mínimo telefonar a dizer que se atrasaria um pouco? Irritada e olhando em meu relógio de pulso algumas vezes, cheguei a conclusão de que era melhor pegar um táxi e fazer o caminho sozinha. Caso contrário perderia o exame. E eu não podia esperar mais, não queria esperar mais para descobrir se teria de comprar carrinhos de controle remoto ou bonecas. 

A explicação para nosso desencontro surgiu assim que pedi para o taxista fazer o caminho da empresa, quem sabe conseguiria encontrá-lo ainda por ali, talvez perdido em alguma reunião ou tendo que aguentar conversas esfarrapadas de um de seus sócios. Mas a gravidade da cena que presenciei era mais elevada, bem mais elevada. Joseph conversava - eu diria que animado - com uma mulher vestida socialmente, que parecia envolvida na conversa que os dois não faziam questão de arruinar. Fechando as mãos em punhos, respirei fundo diversas vezes, virando o rosto bruscamente quando notei que ele percebeu quem estava dentro daquele taxi que se afastava aos poucos da Empire. Eu não ia chorar, não ia mesmo. Por mais que meu período de sensibilidade continuasse ali, não daria o braço a torcer. Se ele preferia se divertir em conversas casuais com mulheres de corpos perfeitos e cinturas finas, o problema era dele. Nada conseguiria diminuir minha felicidade. 
Quem eu queria enganar? 
As oscilações de humor fizeram com que eu me sentisse traída e neurótica ao mesmo. Era óbvio, fora apenas uma conversa. Provavelmente ela poderia ser até uma das novas sócias, provavelmente acertavam detalhes sem importância. Provavelmente não recebi ligação alguma dele porque a maldita bateria de meu celular acabara antes que eu pudesse notar. 

Coloquei os pés para fora do carro, entregando o dinheiro ao motorista e saindo completamente. Encarei a branca e impecável fachada da clínica, deslizando os dedos pela barriga. Sozinha, caminhei até a entrada e fiz os procedimentos necessários para, enfim, efetuar o ultrassom. Ele não estava comigo, tínhamos brigado novamente. Suas palavras me feriram um pouco, apesar de saber que no fundo aquele não era a intenção. Criticou severamente minha insegurança. 
"Lide com o fato de que vou conversar com muitas mulheres durante essa vida de empresário que levo, mas você é quem vai estar sempre nos meus pensamentos, até mesmo durante as conversas mais interessantes". Essas foram suas palavras, potentes e invencíveis, derretendo meu orgulho. 
O motivo dos sorrisos trocados com a mulher: minha gestação. Ele a avisava que tinha de correr para me buscar, pois um decisivo ultrassom era aguardado. E a mulher, mãe de dois filhos, simplesmente o parabenizava. 
Sem saber explicar o porquê, fui tola e menti ao dizer que tinha remarcado o exame. Culpava-me, me torturava de todas as maneiras possíveis enquanto esperava meu nome ser chamado. Joe era o pai, Joe tinha que presenciar tudo. Então por que o privei disso? É claro, porque o impulso era meu pior inimigo. Sentindo uma lágrima querer escapar por um dos meus olhos, retirei o celular já com carga da bolsa, discando rapidamente seu número. Não era tarde demais. 
Demetria Jonas. - ergui o rosto com velocidade, fitando um pouco consternada a recepcionista que indicava um dos consultórios ao fundo do corredor com paredes de vidro. Levemente tonta, levantei-me e joguei o celular na bolsa, alcançando a porta e entrando. Será que Joseph me perdoaria? 
Demetria estúpida, idiota, impulsiva. Impulsiva! 

As portas do elevador finalmente se abriram, e eu praticamente atirei meu corpo para fora. Com os olhos vermelhos e inchados, borrados de maquiagem, olhei para tudo ao redor, tentando encontrá-lo. Minhas mãos suavam loucamente, meu coração batia tão forte que eu era capaz de senti-lo em minha garganta. Pegava-me sorrindo sozinha, gargalhando sozinha enquanto tentava mesmo que aos tropeços chegar até a área correta. Aproximando-me de seu escritório, dei um jeito de limpar parcialmente o rosto e fui direto até uma das largas portas. Assim que pensei em girar a maçaneta, uma voz alertou: 
- Não entre ai, ele está em reunião! 
Não virei para checar quem era. Pouco me importava com reuniões. 
Adentrei o recinto. Primeiro, todos os sentados em cadeiras que rodeavam uma extensa mesa de vidro olharam para mim, um pouco surpreendidos pelo meu semblante tão feliz e acabado ao mesmo tempo. Joseph se encontrava no fundo da sala, com os olhos grudados em algo que era transmitido por uma grande tela de plasma presa a parece. Provavelmente estranhando o silêncio, ele virou o corpo e se surpreendeu ao me encontrar ali, estagnada no batente da porta. Hesitante, deu apenas um passo a frente. As pessoas ao nosso redor procuravam por uma explicação, enquanto nos dois procurávamos por algo no olhar um do outro. 
Tomei fôlego, preparada para dizer. 
É um menino

Ele me perdoou. E como não poderia? Depois de correr até mim, me pegar e me girar em seu colo sem medir conseqüências, as indiferenças anteriores ficaram para trás. Joseph disse que esperaria mais algum tempo, e que me acompanharia no último ultrassom, mesmo que tivesse que enfrentar uma guerra para isso. 
Jogados no sofá, assistíamos a um show da banda Muse, uma de suas favoritas. Enquanto eu tentava me distrair com a performance incrível, Joe procurava algo em um livro. Seus olhos focados nas páginas me divertiam. Cutuquei sua perna algumas vezes, tentando roubar sua atenção. 
- O que acha de Adam? 
- Não. - só então fui perceber que aquele era um livro com nomes para bebês. Ainda não tínhamos decididos um dos detalhes cruciais. 
- Dylan? - arriscou outra vez. 
- Não. - respondi indiferente. 
- Harvey? 
- Não. - bufei desanimada. Só aceitaria o nome que me causasse algum tipo de sensação imediata assim que pronunciado. 
- E o que acha de prestar atenção em mim? - sua mão segurou meu queixo, virando meu rosto em sua direção. O silêncio se alastrou, exceto pelo som da voz fenomenal de Matthew Bellamy
Meus olhos se arregalaram e me coloquei de joelhos no sofá, estralando os dedos como quem pensa em algo genial. 
- É isso! Matthew! Será Matthew. 
- Olá, Matthew. - um Joseph sorridente cumprimentou minha barriga, sem fazer qualquer objeção. 

7º mês

Roupinhas, sapatinhos, chupetas, mamadeiras, carrinhos, berços, cadeirinhas diversas, móveis e decoração para os quartinhos, um carregamento de fraldas, produtos para higiene, pomadas, remédios, brinquedinhos, pelúcias e muito mais. 
Joseph segurou minha mão de forma firme, impedindo que entrássemos completamente naquela gigantesca loja. Deveria ter notado que eu estava prestes a sair correndo pelo lugar como uma criança indo a um parque de diversões pela primeira vez. Parte do enxoval já fora comprado, porém, sempre ficava evidente que algo fora esquecido. Ainda bem que eu contava com a ajuda de Cassie, que naquela época ainda era uma boa amiga. Tinha me dado valiosas dicas sobre o que comprar ou não. 
- Estamos prontos? - questionou Joseph, que engoliu em seco, como se ao invés de entrar em uma loja com tudo e mais um pouco para bebês, entraria em um violento campo de concentração. 
- No três. 1, 2... 
Minha contagem foi interrompida assim que ele puxou minha mão para frente e nos colocou de uma vez dentro da loja. 
Enquanto eu andava e olhava tudo de forma indecisa, esqueci de Joe e o deixei vagando sem rumo pelos corredores. O clima daquele lugar, até mesmo o cheiro que tanto lembrava bebês, fazia com que eu quase começasse a saltitar pelos corredores, escolhendo o que deveria levar ou não. Tinha um apreço maior por macacões. Dos mais coloridos, até os de cores claras. E não queria saber de comprar tudo azul, queria variar. 
Era imprescindível lembrar que a mãe não ficava de fora daquelas intermináveis compras. Lingeries apropriadas, roupas apropriadas, produtos para a pele, além de alimentos saudáveis e vitaminas. 
Pegando coisas necessárias para mim também, chamei Joseph para me ajudar a escolher entre dois conjuntinhos adoráveis que me deixavam em dúvida. Logo parou ao meu lado um pouco afobado, segurando dois pacotes de fraldas e com uma camiseta em seu ombro. Com os cabelos levemente bagunçados e um pouco ofegante, até parecia ter corrido em uma maratona. Comecei a rir.
- Temos que levar dessas também, ouvi dizer que são ótimas. - meu marido andava entendendo até de fraldas? Fascinante. - E... - ele ergueu as sobrancelhas, jogando um dos pacotes em minhas mãos, retirando a miniatura de camiseta dos ombros. A estendeu e colocou em seu peitoral, fingindo vesti-la. Em seguida me olhou com uma expressão infantil. Gargalhei novamente. - O que acha disso aqui? - a pequenina peça de um azul bem clarinho possuía uma estampa no centro, com os seguintes dizeres: My daddy rocks! 
Em um impulso, eu tive que tirar a pequena câmera do bolso do casaco e registrar aquele momento. 
- Veja só, Matthew, seu pai tem uma grande qualidade: não é nem de longe convencido! - ironizei, olhando para tudo que já tinha escolhido levar. O guarda-roupa de Matthew já podia ser considerado mais variado que o de sua própria mãe. - Posso saber onde é que você estava? E como assim entende de fraldas agora? 
- Você não é a única que sabe escolher as coisas, Demi. - avisou bem sério, olhando para as duas peças de roupa que eu segurava. 
- E onde aprendeu a diferenciar o que é certo e o que é errado para um bebê? - perguntei interessada, achando incrível o fato de que ele queria participar de qualquer mínimo acontecimento, sem exceção. Não era como aqueles pais que ficam perto só para não carregar uma culpa eterna. Até discutimos no dia em que o berço foi comprado, porque nossos gostos não eram nem de longe semelhantes. 
- Li mais livros e vi mais documentários do que você, senhora Jonas. 
- Certo, mamãe Joseph, então decida qual desses dois vamos levar, enquanto vou procurar o restante das coisas. 
- Por que não levar os dois? 
- Porque logo não teremos mais onde colocar roupinhas de bebê! 
Apesar das incansáveis tentativas de minhas amigas de me convencer a organizar um chá de bebê, o que eu apreciava de verdade era escolher tudo, até mesmo lencinhos, mamadeiras com bicos apropriados e o aroma dos sabonetes, entre outras coisas. Escolher a dedo os produtos para lhe dar o primeiro banho, por exemplo. Pensei em levar um shampoo de aroma muito agradável e delicado que encontrei, mas será que ele nasceria com cabelo? Ou teríamos uma linda careca para alisar? Por via das dúvidas, peguei dois frascos, continuando a fitar meticulosamente tudo ao meu redor. 
Caso tal chá de bebê viesse a acontecer, seria apenas para nos divertirmos um pouco, já que o enxoval estava praticamente completo. Apenas esperava pelo seu dono, que logo daria o ar de sua graça. Finalmente. 

Quem disse que eu conseguia dormir? Maldita insônia. 
Vendo por outro ângulo, não era tão ruim não conseguir pregar os olhos. Ultimamente eu andava tendo sonhos estranhos. Em um deles conversava com meu bebê, mas sua voz era como a de um adulto. Um pouco traumatizante, levando em consideração que a voz era grossa e assustadora. 
- Meus seios estão maiores. - olhei para os mesmos ao dizer, fazendo uma careta de descontentando enquanto apalpava um deles, que já deveria estar cheio de leite. Pouco me importava em parecer sedutora naquele momento. Minha auto estima sofria com o desgaste tanto quanto um cartão de crédito nas mãos de uma viciada em compras. Fora esmagada pela sensação de que minhas formas nunca mais seriam as mesmas. Eu queria minha cintura de volta! O estranho era que, assim que eu lembrava do bebezinho se desenvolvendo dentro de mim, não fazia mais questão alguma de pensar em meu corpo. O importante era o bem estar dele. 
- Em que mundo estranho isso é ruim? - a voz marota de Joseph me arrancou daqueles pensamentos, e não pensei duas vezes antes de dar um tapa aborrecido em uma de suas coxas cobertas pela calça simples de moleton. Ambos carregávamos olheiras fundas, já que ele não queria dormir sabendo que eu continuava acordada, provavelmente assistindo algo que me faria chorar. E em meio ao choro desnecessário, eu acabaria o acordando assim que tentasse enroscar meu corpo ao seu em busca de consolo. 
- E você já reparou nos meus quadris? Ando parecendo um violão... Um violão maior que todos os outros! Demetria, o violão mor! - resmunguei tristonha, com direito a bico e semblante de uma garotinha decepcionada, estendendo meus braços como se pudesse enxergar aquelas palavras desenhadas no ar. 
- Novamente: em que mundo estranho isso é ruim? 
- Você não me entende. Saia daqui, agora! - apontei risonha para a porta, tendo a ordem completamente rejeitada. Joseph fez o contrário: deitou-nos na cama e ficou alisando minha barriga, iniciando um falatório com Matthew. Aquele era apenas o início de uma série de monólogos impagáveis. 

8º mês

Seja lá quem tenha inventado o ultrassom em 3-D, a pessoa certamente merece uma ovação de pé. Eu não conseguia parar de encarar e encarar mais uma vez a foto impressa. Conseguia ver perfeitamente o rosto, as pernas e braços perfeitos. Apesar da imagem estar um pouco amarelada, não afastava a mágica do momento. Fora que também existia a gravação, que eu obrigaria Matthew - quando tivesse em média dezoito anos - a assistir. Ele reviraria os olhos, dizendo que eu deveria parar de chorar, pois isso o deixava envergonhado. 
Enxergando o ótimo clima do lado de fora, separei roupas apropriadas e caminhei até a frente da piscina, sentando-me em uma espreguiçadeira. Depois que exagerei no protetor solar, deitei preguiçosamente o corpo, aproveitando o sol. Seria mesmo possível Joseph me achar sexy com aquele barrigão? Isso me obrigava a sorrir sozinha, enquanto sentia os movimentos de meu bebê, involuntariamente acariciando a barriga. E ele parecia se acalmar quando sentia meu carinho. Mas, se apenas parasse por um segundo, ele já começava a chutar novamente, como se me repreendesse e dissesse "Mamãe! Quem foi que pediu para você parar?". 
Com os olhos fechados, tentando criar um filme com as cenas de meu parto na mente, percebi que poderia entrar em pânico a qualquer momento. Eu tinha sido avisada de que, depois dos oito meses, tudo pode acontecer. Matthew poderia inesperadamente decidir "Eu quero sair!" e então eu teria de correr até o hospital, me fingindo de forte só para Joseph não ter um colapso nervoso. 
E, como mágica, foi só pensar no dito cujo para que ele surgisse ao meu lado, ajoelhando-se e aproximando os lábios de minha enorme barriga. Os grudou ali por segundos, deslizando os dedos por toda a extensão curvada. 
- Olhe só para ela, Matthew. Será que daí de dentro você já tem noção do quão linda sua mãe é? - fingi não estar ouvindo o que ele dizia, só para arrancar mais palavras estimulantes de seus lábios. O homem pensava que eu não era capaz de perceber que ele poderia começar a subir pelas paredes a qualquer momento. Estava enlouquecendo. A vida de Joseph sofreu uma sinuosa reviravolta. Um dia permanecia diante de um caos sem limites e, no outro, abrindo os olhos, ele encontrava apenas algo que nunca acreditou ter: família. - Vamos combinar uma coisa, certo? Quando você nascer, eu serei a primeira pessoa que vai te pegar no colo. 
- Claro que não! - reclamei, abrindo os olhos e negando com a cabeça. - É de dentro de mim que ele vai sair, meu amor, vou segurá-lo primeiro e não adianta tentar retrucar. 
- Posso terminar, Demetria? 
- Vá em frente. - então ele voltou sua atenção para o bebê. 
- Quando tiver, não sei... Uns cinco anos, vou te mostrar meu lugar favorito em todo o mundo. 
- Por que perder tempo com isso, Joseph? Você sabe muito bem que seu lugar favorito é o nosso quarto, e esse cômodo ele já vai estar cansado de ver. - ergui os lábios em um sorriso malicioso, arrancando alguns risinhos dele. 
- Sua mãe perdeu totalmente o senso romântico e sensível que sempre teve, como pode perceber. - lamentou com minha barriga. - Mas vamos fazer ela recuperá-lo, certo? Você, com seu choro, fraldas para trocar, os primeiros passos, as primeiras palavras. E eu... - mordeu seu lábio, olhando diretamente para mim e erguendo uma sobrancelha. - Deixaremos isso para lá, você ainda é muito pequeno para presenciar uma conversa adulta
Mesmo diante de um momento tão delicado, como a conversa com um filho, Joseph não perdia aquele ar viril. A desenvoltura na hora de me deixar encabulada com sua forma sempre tão carinhosa e prestativa de ser. Um homem de verdade, o homem que desejei desde menina, mesmo que não reconhecesse na época. Um homem para me amar independente de tudo, um homem que amaria e defenderia seus filhos com unhas a dentes, custe o que custar. E eu não podia deixar de enfatizar a sua pose de sedutor. Vivia dizendo que eu conseguia ser sexy e adorável ao mesmo tempo, mas ele também era capaz de sustentar duas qualidades tão distintas ao mesmo tempo, também. Não, na verdade, eram três qualidades: sedutor, cavalheiro e... Um pai

Jamie se divertia livremente pelo jardim, aproveitando a primeira remessa de flocos de neve que anunciavam a chegada de um rigoroso inverno. Com duas canecas de chocolate quente, eu o chamei. Logo o garoto veio correndo em minha direção, pegando sua caneca. O convidei para irmos até a varanda localizada nos fundos. Sentia que precisava dar mais atenção a ele, conversar mais. Devido a todos aqueles meses carregados dos mais diversos acontecimentos, algo me dizia que Jamie era tratado de forma vaga. E, por mais que ele não deixasse isso transparecer, decidi que teríamos uma conversa longa e leve, para colocar nossa amizade de mãe e filho em dia. Eu não sabia dizer quem tinha a ansiedade mais elevada: ele ou Joseph. Ou dois ainda conseguiriam me deixar louca com tantos preparativos e ideias. 
Nos sentamos em um dos bancos estofados da varanda, contemplando a neve. 
- Por que meu irmãozinho demora tanto para chegar? - perguntou ele, um pouco impaciente. Segurei sua mão coberta por uma luva quentinha e a levei até minha barriga coberta pelo casaco grosso. Ao notar o movimento interno, Jamie sorriu abertamente. Perdi-me nas sardas de seu rosto, e em seus olhos tão verdes e puros. Uma das melhores coisas que fiz em minha vida fora adotar aquele ser humano tão maravilhoso, livre da maldade e cheio de boas intenções. Um pequeno cavalheiro. 
- Esse chute foi ele lhe dizendo para não se preocupar, Jamie, pois logo estará aqui com você. 
Meu filho esfregou as mãos, ansioso. 
- Não precisa se preocupar, ok? Eu vou cuidar direitinho dele. Quando ele tiver dez anos, eu vou ter... - olhou para cima, contando nos dedos. - Vinte anos! Não vou deixar que os valentões da escola roubem o seu lanche, e nem que ele fique sentado durante o recreio inteiro só porque a garota mais bonita da classe não liga para ele. Seremos os melhores irmãos do mundo! - comemorou, gargalhando e me obrigando a acompanhá-lo. 
- Tenho certeza que sim. Eu te amo, sabia? - toquei a ponta de seu nariz com meu dedo, grudando os lábios em sua testa. 
- Eu também te amo. Não vou cuidar só do Matthew, mas de você também! 
- E do Joseph, você não vai cuidar? - fingi surpresa. 
- Não! - negou rapidamente, como se eu tivesse dito algo errado. - Ele é quem cuida de todos nós. Ele é o Rei, sabe? O Rei é quem cuida do reino. - notei ali a influência que os livros que ele gostava de ler causavam sobre seu jeito de enxergar o mundo. Era adorável. - Você é a Rainha, e Matthew e eu somos os príncipes
- Como William e Harry. - concluí, achando aquela comparação desnecessária, mas mesmo assim rindo. O destino dos meus meninos seria bem melhor do que o daqueles dois, mesmo que não fossem príncipes de verdade. 
- Eu gostaria que todas as crianças do orfanato onde eu estive encontrassem pessoas como vocês. - ele confessou visivelmente triste, enquanto olhava para as próprias mãos, pensando em como a vida às vezes não era nada justa com alguns. 
- Sempre existirá alguém que vai nos encontrar, Jamie. A todos nós. Mesmo que não seja um pai ou uma mãe, pode ter certeza de que ele vai aparecer. Para sanar nossas duvidas, curar nossos medos e nos proporcionar a certeza de que, se olharmos bem de perto, ninguém é totalmente sozinho no mundo. Esse alguém existe, por ai, e ele vai encontrar a pessoa que precisa dele... Quando ela menos esperar. 
Jamie ergueu uma sobrancelha, olhando diretamente para mim e tentando esconder um risinho. 
- Você é a pessoa que encontrou o Joe! 
- Sou? 
- Sim, ele me disse. 
- Disse a você, mas não disse a mim? - encenei um suposto desapontamento, o divertindo ainda mais. 
- Homens têm segredos! - Jamie tentou me consolar, com sua pose de homenzinho sábio. 
Nos abraçamos, permanecendo daquele jeito por um longo tempo. Cada novo floco daquela neve parecia o fragmento da certeza de que, tendo Joseph, Jamie e Matthew comigo, o resto poderia ser consertado. A guerra teria uma trégua. A tempestade cessaria dando lugar ao arco-íris. O amor venceria o ódio. Porque, sendo ficção ou realidade, é o que sempre esperamos. É o que lutamos para alcançar. É o que, mesmo de maneiras confusas e inexplicáveis, acaba acontecendo. 

9º mês

Eu pensei que teria um parto calmo, pois passei tempo demais me preparando para ele. 
Porém... Na metade do nono mês, fui pega de surpresa. 

Contrações. Lágrimas. Medo. Bolsa rompida. Contrações. Felicidade. Medo crescente. Contrações. 1, 2, 3... Respire
Daquele momento em diante, as coisas passavam por mim como flashes de imagens distorcidas. As lágrimas embaçavam minha visão, a dor impedia que eu pensasse com clareza. Onde Joseph estava? Onde estaria ele para me encorajar naquele momento? O meu parto. A hora do nascimento de Matthew se aproximava veloz. Todos os órgãos do meu corpo pareciam funcionar sob pressão. Inspire e expire, eu dizia a mim mesma, tentando controlar a falta de ar. Felizmente minha mãe permaneceu ali, segurando minha mão enquanto algum veículo em alta velocidade ultrapassava sinais só para que eu conseguisse chegar logo até o hospital. 
Eu começava a pensar que ia morrer. Os intervalos entre as contrações ficavam cada vez mais curtos, eu sentia um líquido quente escapar do meio de minhas pernas e escorrer. A ideia de que talvez pudesse ser sangue prolongou meu choro. Inconsolável, tudo que eu ainda sabia fazer era chamar por Joseph. Chamar na esperança de que em um passe de mágica ele pudesse surgir ali e espantar todos aqueles pensamentos ruins. Seu sorriso brando e olhar confiante me manteriam sã e salva até o momento em que toda a espera seria recompensada por um choro. Um choro que exalava vida nova. Novas esperanças. 
Eu realmente não conseguia me lembrar com clareza de todo o trajeto. 
Com os ouvidos zumbindo um pouco, abri os olhos e gritei de dor ao receber outra contração. Já estava em uma maca que contornava aqueles corredores brancos em alta velocidade. 
"Calma, meu amor. Não tenha medo, mamãe está aqui por você. Venha, não deixarei que nada de mal lhe aconteça." Mentalmente eu conversava com meu bebê, segurando minha barriga para tentar acalmar a guerra que parecia estar sendo travada dentro de mim. 
- Respire fundo, querida. Vai dar tudo certo. - uma voz calma e feminina dizia, enquanto eu senti uma mão tocar minha testa. 
Então, a voz dele surgiu, cortando qualquer ruído e aliviando por segundos minha dor. O cheiro de Joseph estava ali, eu conseguia sentir. Seus dedos tocaram minha barriga e com esforço grandioso consegui erguer meu rosto e encará-lo. Mais lágrimas foram expulsas, e o desespero que me deixava ofegante não cessou. Tentei erguer minha mão para segurar a sua, mas logo a maca já se movia novamente. Uma luz branca e brilhante ameaçava me cegar, enquanto eu me perguntava se aquele era o meu fim. 
"Matthew! Independente de qualquer coisa que aconteça, você vai ficar bem. Quero que saiba que eu te amo muito, e lutaria novamente, cada segundo, por você.
- Vamos, Demetria, empurre! 
Empurre, empurre, empurre, empurre. Empurre! 
"Estou empurrando tanto que é como se isso fosse me matar! Não é o suficiente para você, babaca?
A vontade de gritar aquelas palavras não era maior que a fraqueza que me abatia. A força que me estimulavam a fazer criava a ilusão de que meu corpo explodiria na tentativa seguinte. As pontas dos meus dedos formigavam, meu rosto totalmente encharcado pelas lágrimas. Eu não aguentava mais. Queria que terminasse logo, queria descansar. E torcia para que aquele descanso não tivesse relação com a morte. Eu não queria morrer, não queria deixar aquela vida. Não, não quando um ser humano totalmente dependente de mim tentava chegar saudável àquele mundo. Minha visão turva estremeceu, pontos pretos surgiram por todos os lados. 
De repente, o alívio. 
Como encontrar um oasis no meio do deserto. Como descobrir que um ente querido está bem, logo após de te afirmarem o contrário. Como correr de encontro ao futuro quando sabe que não se arrepende de nada que deixou para trás. Como o sorriso de uma criança. 
O choro de um recém-nascido
Lá estava. Potente, alto, vivo. Meu Matthew chorava a todo pulmões, declarando ao mundo sua existência. Mesmo que incapaz de fazer qualquer esforço, tentei ergueu um pouco minha cabeça. Queria enxergá-lo, queria pegá-lo em meus braços. Queria gritar de felicidade. Ele estava bem. E eu estava viva! 
O sentimento de paz fazia milagres enquanto se movia solto pela minha corrente sanguínea, o amor fazia aquele coração fraco bater com mais afinco. Matthew fora colocado de frente para mim, seu corpo aparentemente saudável, apenas um pouco arroxeado em algumas partes, finalmente ao meu alcance. Conseguindo esticar um dos braços, tomei a liberdade de tocar sua bochecha quente, macia e úmida, fitando os pequenos olhos parcialmente abertos. Tão frágil, a minha junção com Joseph. Como se não bastasse ter visto no ultrassom 3-D que ele era perfeito, tive de forçar minha vista e confirmar novamente: braços perfeitos, pernas perfeitas, vários fios de cabelo. E sua genitália masculina, mais comprovada do que nunca. 
- Oi, meu menino. Bem vindo! 
Lamentei, debilitada. Não o colocaram sob meu tórax para um contato maior. Mas talvez a explicação fosse o fato de que minha pressão arterial baixou demais, e eu simplesmente não tinha condições por hora. Então, o assistindo ser levado para longe, deixei as pálpebras pesadas cederem, sendo vencida pelo cansaço. No entanto, tenho certeza de que adormeci com um sorriso singelo nos lábios, pois felicidade e sensação de dever cumprido não faltavam por ali. 
Nove meses. Nove longos meses em que tive a oportunidade de crescer como pessoa, mulher, amiga e, principalmente, mãe. Se me oferecessem a chance de mudar qualquer mero acontecimento pertencente àqueles meses, não aceitaria. Não mudaria absolutamente nada. E, tinha de confessar: mal podia esperar pela repetição daquele emaranhado de descobertas, dúvidas, planejamentos, sentimentos e vontades. 
A gravidez não é nenhum mar de rosas, mas você encontrará muitas delas pelo caminho turbulento e inesquecível. 

(Para acompanhar uma das cenas seguintes, a primeira conversa do principal com seu filho, clique aqui!)

Fim do flashback.


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